quarta-feira, 21 de abril de 2010

D. Sebastião e o Adamastor

O REGRESSO DE D. SEBASTIÃO

Quem está de fora...racha lenha? Desculpem lá mas eu não me sinto "de fora" e está demasiado frio por cá para que me possa entregar ao exercício, "só para aquecer".

Vamos lá com alguma calma e descontracção analisar este apologético entusiasmo em torno da surpreendente (será?) candidatura à Presidência da República Portuguesa do Dr. Fernando Nobre.

Que me perdoem todos quantos possam discordar, mas estou a ficar com a impressão de estar a presenciar um acto de prestidigitação . De repente, alguém descobriu o Messias salvador da Pátria, aquele que, sem mácula nem mentiras, saberá sacrificar-se para remissão dos nossos pecados! Bem sei, nós portugueses, ainda não conseguimos libertar-nos da esperança do regresso de D. Sebastião e estamos sempre predispostos, como povo, a aceitar espontaneamente, de coração aberto, a primeira aparição milagrosa que nos surja pela frente, sem deixar que a razão interfira no nosso entusiasmo messiânico.

Que um cidadão molde o seu percurso de vida pela ambição de chegar à magistratura suprema do seu País, é uma atitude legítima que em nada diminui o carácter e a honradez de quem a toma, sempre e quando, o acto seja frontalmente assumido, sem disfarces e falsas motivações, apenas e tão só por estar a exercer um direito próprio, sem pretender com essa acção "potenciar / virtualizar / privilegiar / qualificar" o seu direito, em relação ao direito de outros, e sempre e quando tal atitude não seja, ou evidencie ser, instrumentalizada ao serviço de terceiros, para fins que nada têm a ver com os interesses do País. Estes aspectos éticos, tornam-se muito mais significativos, quando a pessoa em questão pretenda retirar da ética da sua imagem a mais-valia da sua oferta, pretenda recorrer às virtudes da sua ética e da sua moral humanista e solidária, como garantia da excelência da sua prestação futura.

Neste caso, o Dr. Fernando Nobre, pretende fundamentar, justificar, engalanar a excelência da sua futura prestação, adiantando principalmente os seguintes argumentos:

a) apresenta-se por imperativo de consciência, livre de compromissos partidários, em nome da valorização do exercício da cidadania e da representação da sociedade civil despartidarizada.

b) apresenta-se pela possível comprovação de que a democracia não se pode nem deve esgotar nos partidos políticos e que, por isso, o protagonismo adquirido pela prática de outras actividades cívicas de alto valor humanitário, deve ser considerado mais meritório que o dos políticos profissionais.

Acreditar, ou não, nestes argumentos; julgá-los verdadeiros, pertinentes, credíveis e suficientes, ou não, é tarefa reservada ao mais íntimo de cada eleitor. Porém, analisá-los à luz do percurso de vida do protagonista para neles poder introduzir alguma fiabilidade baseada em sinais capazes de confirmar a coerência do que agora é afirmado, parece-nos uma atitude razoável para quem pretenda exercer o seu direito de voto com um mínimo de ponderação dos diferentes factores caracteriais e dos possíveis interesses em jogo.

Julgo saber, que existe no nosso povo, de forma transversal e generalizada, a tendência para louvar toda e qualquer xico-espertice, desde que o entorse à ética ou ao direito seja feito com suficiente grau de fingimento e de cobertura legal. Quando tal acontece, estamos sempre prontos a perdoar o delito e a enaltecer a inteligência do delinquente.

Nestas situações, as afirmações e argumentações de cada interessado, não são, infelizmente, susceptíveis de comprovações factuais incontestáveis e definitivas. O antigo ditador Oliveira Salazar, confrontado com esta dificuldade, optou por tentar ultrapassá-la afirmando: - “em política o que parece é“ isto dito por tão experiente manipulador da opinião pública e da história, é capaz de ter algum fundamento.

É por isso que, fazendo fé naquilo que parece, e como parte desinteressadamente interessada na candidatura de Manuel Alegre, entendo ser útil, a título de simples exercício criativo e ficcional, contar-vos uma história que, se a minha capacidade narrativa não fosse tão limitada, poderia proporcionar uma interessante peça de teatro mais ou menos burlesco, em três actos, que teria por título:

A RESSURREIÇÃO DO VELHO ADAMASTOR!

Num primeiro acto apareceria um personagem parecido com o velho adamastor mas de ar bonacheirão e pensativo, preocupado. Debruçado sobre as águas do lago do campo grande, a interrogar o baço espelho d’água, espantado por aí ver reflectida, não a sua imagem, mas a do “mostrengo de breu de cor de rosa vestido pilotando a grande nave da democracia”: - some-te mostrengo… voltei sim… e de novo ao leme deste barco que é só meu… some-te… ó nave de piratas e falsários, e tu… que me olhas altaneiro, bem te conheço o disfarce do vate tenebroso que a minha prometida glória roubou, cantando por todo o reino ser melhor do que eu, some-te ó trovador dos novos tempos que ousas querer chegar onde só eu devo mandar… desaparece fantasma atormentador dos meus sonhos… hei-de reincarnar para de novo te fazer naufragar… maldita a hora em que te aceitei como tripulante deste barco onde ao leme sou mais do que eu… sou o Pai da democracia deste povo que é só meu… - levanta-se transfigurado e em êxtase proclama… obrigado meu Deus… obrigado… valeu a pena passar por esta alucinação… obrigado pelos teus sinais, pela tua iluminação, encarnarei em quem me dizes… isso faz acabar o meu pesadelo, a minha fome de vingança irá juntar-se à sua vontade de comer… vamos acabar com estes desobedientes aprendizes de políticos profissionais que já me julgavam morto… o Albuquerque do socorro à desgraça, vai ser capaz de calar, até os ventos que passam. Ah… Ah… Ah…

No segundo acto, sentados num banco da praça do império, suficientemente retirado e em voz discreta por causa das escutas, quase em sussurro de orelha a orelha, aparecem o Pai da Democracia Portuguesa à conversa com um nobre travestido de plebeu.

Diz o Pai da democracia: é a sua grande oportunidade meu amigo, já é tempo de capitalizar esse seu protagonismo adquirido fora da política, essa sua imagem de cidadão solidário e humanista, ajudada pelo meu total apoio e dos meus amigos dentro e fora do partido são suficientes para levá-lo à vitória e arrumar de vez com as pretensões desse passarão de mau agoiro do Alegre…

O Nobre travestido de plebeu: vai ser difícil, sem apoios partidários nem meios financeiros o combate é de resultado incerto… veja o que lhe sucedeu da última vez…

O Pai da democracia: não receie meu caro amigo… do outra vez o homem do leme abusou da minha boa fé. Depois de ter prometido casamento ao outro veio namorar comigo e enganou-me, mas agora a sua imagem e juventude são outras, a seu tempo os meios financeiros vão aparecer e estou certo que poderá contar com o apoio não explícito duma grande parte do partido e de todos os outros partidos com quem estabeleceu ligações e que sem a sua candidatura votariam no insolente versejador.

O Nobre travestido de plebeu: mas está certo de poder contar com o apoio do Sá Crotes?

O Pai da democracia: não se aflija meu amigo, com esse ninguém pode contar antes da hora, flutua… flutua, e o mais certo é que venha a fingir que sai fora da contenda, mas não se oporá aos nossos desígnios que até podem muito bem convergir para manter tudo como está… depois da primeira batalha trataremos da segunda, aconselha a prudência a travar uma batalha de cada vez, mas, mesmo nesse caso, pense que vale a pena aproveitar a ocasião como rampa de lançamento para voos futuros e limpar o campo dos nossos inimigos, anime-se homem…

Olhe aí vêm os meus amigos da comunicação social… já sabe… a decisão é sua… eu vou saindo ali por detrás daquela sebe e aproveito para visitar e tranquilizar ali o meu amigo do palácio em frente, não… não, não se incomode, embora saiba que também é da casa, eu também a conheço bem… esteja tranquilo e vá-se a eles que vamos arrasar com esses aprendizes de políticos… Ah…Ah…Ah…

O terceiro acto começaria junto ao monumento aos navegantes, focando o Tejo e a outra banda operária como pano de fundo, com a imensa esplanada apinhada de adeptos da sociedade civil despartidarizada empunhando cartazes em favor da cidadania apartidária. Junto ao mastro da bandeira que ladeia o monumento estaria uma pequena maca coberta por um pano branco com uma cruz vermelha pintada, tendo por baixo a palavra AMIM.

De repente, uma lufada de vento vinda das agitadas águas do Tejo galga o paredão, gera-se o pânico e o Nobre candidato desata a correr esplanada fora em direcção ao palácio presidencial: com o Pai da Democracia em grande aflição a correr atrás dele seguido por uma multidão civil apartidária que grita… não é nada… não é nada… não há nenhuma emergência, não precisa de pedir aviões nem navios... já passou, foi só o barulho do vento que passa!...

Camilo Mortágua

1 comentário:

Anónimo disse...

Olá meu amigo! Somos um país de adamastores domados, de D. Sebastiões (será assim k se diz) reeinventados e de tantos velhos do restelo que falam e lançam maldições e tirando isso não servem para nada... acho k até as maldições já não são o k eram antes. Beijinhos grandes.