Recordando um sábado, dia 2 de Julho de 2005, mas não só. São os pequenos momentos que tornam a vida grande.
Eis a recordação que transcrevo com emoção, transcrição literal de um artigo por mim publicado inicialmente a 9 de Julho de 2005, num outro blog (ACUSO!) encerrado há dois anos:
No passado sábado eu e a minha companheira resolvemos ir comer um peixinho grelhado a Viana do Castelo.
A minha filha mais nova, que tem cinco anos, quase seis, perguntou se íamos a pé. Lá lhe explicamos, pacientemente, que Viana ficava a uma distância que não nos permitia uma ida a pé. Esta insistência pelos passeios a pé é um fenómeno que a acompanha desde os primeiros passos, lembro que nessa altura já era castigo pegar nela ao colo e, ao contrário do que conheço de outros pais, e até de outros filhos, quando fazia qualquer birrinha era frequente, eu ou a mãe, dizermos: Se te portas mal vais ao colo. É verdade, há pais com sorte.
Lá partimos, nós à frente conversando de tudo e de nada, curtindo a manhã quente a apelar para um passeio pausado e conversa trivial, que a moleza do calor não dava para mais, enquanto a trás a criança cantava, falava, interrompia, chamava à atenção para isto ou para aquilo. Ao fim de cinco minutos já perguntava se estavamos a chegar, pergunta que se repetia de 3 em 3 minutos.
De repente, e após um breve e raro período de silêncio, de trás soaram estas palavras bem ritmadas:
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Quero um cavalo só meu,
seja baio ou alazão,
sentir o vento na cara,
sentir a rédea na mão.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Não quero muito do mundo:
quero saber-lhe a razão,
sentir-me dono de mim,
ao resto dizer que não.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Estupefacto interroguei-me, como é que ela sabia aquele tão simples e belo poema?
Afinal a explicação era simples e não tinha nada de transcendente. Temos o hábito de lhe ler todas as noites quando vai para a cama (mais a mãe do que eu) alguns contos, a mãe tinha-lhe lido, há algumas noites atrás, um livro de poemas de Eugénio de Andrade dedicados ao seu filho Miguel.
Não conseguia alcançar a profundidade daquelas palavras ritmadas e aparentemente simples, mas a mensagem foi suficientemente forte para facilmente ter fixado e, num repente, ter sentido necessidade de as reproduzir, Não é capaz, julgo, de medir ainda a profundidade de poema tão simples, mas a marca ficou, por isso a liberdade também passou por alí naquele momento e, tenho a certeza, a marca vai ficar e expandir-se com a maturidade.
Que mais bela e anónima homenagem podia ter recebido Eugénio de Andrade?
Eis a recordação que transcrevo com emoção, transcrição literal de um artigo por mim publicado inicialmente a 9 de Julho de 2005, num outro blog (ACUSO!) encerrado há dois anos:
No passado sábado eu e a minha companheira resolvemos ir comer um peixinho grelhado a Viana do Castelo.
A minha filha mais nova, que tem cinco anos, quase seis, perguntou se íamos a pé. Lá lhe explicamos, pacientemente, que Viana ficava a uma distância que não nos permitia uma ida a pé. Esta insistência pelos passeios a pé é um fenómeno que a acompanha desde os primeiros passos, lembro que nessa altura já era castigo pegar nela ao colo e, ao contrário do que conheço de outros pais, e até de outros filhos, quando fazia qualquer birrinha era frequente, eu ou a mãe, dizermos: Se te portas mal vais ao colo. É verdade, há pais com sorte.
Lá partimos, nós à frente conversando de tudo e de nada, curtindo a manhã quente a apelar para um passeio pausado e conversa trivial, que a moleza do calor não dava para mais, enquanto a trás a criança cantava, falava, interrompia, chamava à atenção para isto ou para aquilo. Ao fim de cinco minutos já perguntava se estavamos a chegar, pergunta que se repetia de 3 em 3 minutos.
De repente, e após um breve e raro período de silêncio, de trás soaram estas palavras bem ritmadas:
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Quero um cavalo só meu,
seja baio ou alazão,
sentir o vento na cara,
sentir a rédea na mão.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Não quero muito do mundo:
quero saber-lhe a razão,
sentir-me dono de mim,
ao resto dizer que não.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Estupefacto interroguei-me, como é que ela sabia aquele tão simples e belo poema?
Afinal a explicação era simples e não tinha nada de transcendente. Temos o hábito de lhe ler todas as noites quando vai para a cama (mais a mãe do que eu) alguns contos, a mãe tinha-lhe lido, há algumas noites atrás, um livro de poemas de Eugénio de Andrade dedicados ao seu filho Miguel.
Não conseguia alcançar a profundidade daquelas palavras ritmadas e aparentemente simples, mas a mensagem foi suficientemente forte para facilmente ter fixado e, num repente, ter sentido necessidade de as reproduzir, Não é capaz, julgo, de medir ainda a profundidade de poema tão simples, mas a marca ficou, por isso a liberdade também passou por alí naquele momento e, tenho a certeza, a marca vai ficar e expandir-se com a maturidade.
Que mais bela e anónima homenagem podia ter recebido Eugénio de Andrade?
1 comentário:
tens razão... difícil seria receber melhor homenagem.
abc
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