Depois passaram as dúvidas e veio o pesadelo. Mas agora o pesadelo acabou, já nem me lembro de nada, porque não há nada para lembrar, foi tudo um engano, uma mentira.
Não tenho medo, não me escondo da verdade, não mascaro a realidade. Não quero dar uma imagem que não corresponde ao que sou. Não gosto de enganar. Não sei enganar!
Não quero ser criticado pelo que não sou, mas não me importo de o ser pelo que sou, com lealdade e frontalidade.
A minha memória ficou apagada e não tem nada de bom para recordar, para além do amor dos e pelos filhos e da amizade dos e pelos verdadeiros amigos.
Já dizia Churchill: pode-se enganar muita gente durante muito tempo, mas ninguém consegue enganar toda a gente todo o tempo.
Agora que acordei do pesadelo, as dúvidas transformaram-se em certezas. Há sempre um dia em que as pessoas acordam. Não é verdade?
Não ouvirão mais lamentações ou queixas, nem acusações, da minha parte. Não fui eu que desejei esta situação, mas a verdade é que não soube, não soubemos, ou não quisemos, encontrar outra saída, mesmo que fosse, e devia ser, a mesma, mas o modo devia ter sido digno e não o foi. Já nada me interessa. Não se pode amar quem não ama. Varri da minha memória o que não interessa, pois de outra forma corria o risco da loucura.
Eu não quero enlouquecer, quero ser a pessoa que sou e não a que estava a ser, ou que me obrigavam a ser, uma coisa. Quero ser pessoa, quero reconquistar a capacidade de amar e de viver. Pois aqui estou eu.
Nunca ameacei ninguém a não ser a mim próprio. Sou uma pessoa de paz. Sou tolerante, mas exijo que também o sejam comigo. Sou frontal, mas dos outros espero frontalidade. Errei e assumo os erros, mas gostava que os outros também assumissem os seus. Quando amo gosto de ser amado.
Só quem não ama, ou não tem capacidade de amar, não comete loucuras. Não se pode amar quem não ama ou não sabe amar, ou ainda quem só se ama a si próprio e não sabe partilhar. Para além de partilhar, amar também é ceder, compreender, ajudar, quando é preciso ajudar. Podemos nem sempre estar atentos ou não perceber que o outro precisa de ajuda, mas há um momento em que tudo fica claro, sobretudo quando o outro tem atitudes diferentes conforme as pessoas com quem está: com uns está tudo bem, com outros está tudo mal. É um logro. Amar uma pessoa assim só pode afectar a nossa sanidade mental. Eu libertei-me.
É fácil lançar acusações, ou fazer análises, quando só se conhece, ou só se quer reconhecer, a ponta do iceberg. Não rejeito os meus erros, os quais, como é evidente, foram muitos, mas era bom que cada um reconhecesse também os seus. Estou neste momento numa situação insustentável, mas que compreendo face aos erros que cometi recentemente, mas era bom que houvesse bom senso de parte a parte e que se reconhecesse os seus próprios erros e se compreendesse que a intolerância prejudica mais do que beneficia quem não merece, nem pode, ser prejudicado. Que haja uma réstia de bom senso é o que eu espero, de mim e dos outros.
Tenho muito, tenho tudo. Amo e sou amado pelos meus filhos. Amo e sou amado pelos amigos. Que mais posso querer? Todos me aceitam como sou, com os meus defeitos e com as minhas qualidades. As suas críticas são sempre bem-vindas, porque são construtivas e me alertam para a correcção de erros. Todos me ajudam a mudar naquilo que devo mudar, sem deixar de ser quem sou. Sem acusações, nem julgamentos sumários. Nem condenações, sem direito a defesa.
Não posso ser frio e calculista, porque sou sensível e emotivo. Não posso ser egoísta, porque sou solidário. Nisto não posso nem quero mudar, mas posso estar mais atento e estarei. Mas posso ser mais interveniente e serei.
De resto foi apenas uma pedra insignificante em que eu tropecei. Uma pequena pedra dura que se acha uma montanha. Ferido de amor também fiquei com a ilusão de que a pedra era de facto uma montanha. Enganei-me, mas custou a perceber.
Fui à beira do mar, peguei na pedra e, com todas as minhas forças, atirei-a para bem longe. Seguiu aos saltos e a chapinhar tudo que estava perto de si. Adeus pedra, vai para bem longe e fundo onde poderás estar rodeada de outras pedras como tu e sentires-te aconchegada e confortável. Todas as outras pedras são iguais a ti, não tens mais nada com que te preocupar.
Já não sinto amor, já não sinto mágoa, nem raiva, nem rancor, nem dor. Já não sinto nada, apenas alívio e indiferença.
Sei que um dia tropeçarei numa "coisa" fôfa, meiga, sensível, emotiva, amiga, solidária e autêntica que será do tamanho que quiser ser e que saberá aceitar-me tal como sou e então ambos poderemos construir de facto uma relação em que 1 e 1 seja sempre 1 + 1 e não 2.
Ponto final, parágrafo. Dá-se início ao novo capítulo.
Spiritwolf em 17 de Setembro de 2007